Avô, deve ser uma palavra derivada do Ah VÔ!
Era assim que eu falava com ele, 'Ahh vô!!' Com um tom de manha na voz, e depois eu saia rindo, era fácil.
Já tentei escrever centenas de textos sobre você, mas acho que eu poderia escrever um livro inteiro sobre como conviver com você, ops com o senhor, era engraçado.
Ninguém escapava de seus apelidos maliciosos, nenhum parente, nenhum namorado, "pista de pouso de mosquito, carrapatão, bola 7, enrugadinha, caguincha, pulga da camisola da Natália...", esses e quantos outros me fizeram segurar o riso enquanto a visita chegava em casa.
Ele bebia agua e bochechava o liquido, as vezes ele fazia um chafariz com a agua, comida, ele sempre dava um jeito de fazer as coisas mais nojentas e mais engraças, e sempre ao terminar uma refeição ele olhava com tom desafiador para minha mãe (que é sua filha) e limpava a boca na toalha de mesa, o que a deixava furiosa, mas era impossível conter o riso.
Um homem soldado da cavalaria, que nunca sentia frio, mas que se cobria só porque estavamos enchendo muito saco demais, e usava sabão de coco nos cabelos, sabonete era frescura, sentir dor? Não, não... um homem da cavalaria, do batalha 11, não!
Quando eu era criança eu achava que ele implicava comigo, depois eu descobri que era a maneira de ser carinhoso. E aprendi a retribuir na mesma moeda e a me divertir muito com isso!
E as vezes eu fico procurando algum defeito pra lembrar que ele era humano! Desculpem por isso, mas é que nunca, nem em vida, nem pós morte ouvi alguém falar qualquer coisa que colocasse em questão o seu caráter, nunca ouvi, e olha que ele teve 93 anos pra fazer isso.
Tudo bem eu sou uma puxa saco inveterada, uma fã incondicional, sempre fui mesmo antes de o avô alçar o voô. Talvez esse seja um dos frutos de alguém que plantou a vida inteira o amor, carinho e dedicação pela família.
Aos finais de tarde ele colocava sua cadeira de fios na varanda e ficava junto com seu cachorro, tomando uma vitamina de abacate ou saboreando alguma fruta, que o cachorro era obrigado a comer. Muito bem divido por sinal, um pedacinho pro Bob e outro pra ele, uma lambida do bob e outra para ele!
Ele me dizia sobre as coisas que não eram certas, e sempre buscava aguma maneira de apaziguar qualquer intriga, ele sempre tinha alguma coisa simples e sábia para dizer, para aconselhar, mesmo quando era o silencio. "O que é certo é certo". "Nunca se case com um japonês, raça amarela é má" (uma sabedoria inspirada nos filmes de guerra feitos pelos EUA). Ele sentia compaixão pelas pessoas, e sempre buscava uma forma de poder ajudar, ele nunca mais se casou porque amou apenas uma mulher, ainda que ela tenho o deixado, isto porque a morte a ceifou ainda muito jovem, talvez ele tenha se apaixonado depois, algumas vezes, mas nunca amou outro alguém. O que é muito triste, pois ele merecia um novo amor, mas que nos faz suspirar tamanho sentimento cativo por uma mulher. Um homem a moda antiga no sentido genuíno.
Ele me chamava de borboleta e tirava sarro de tudo que eu fazia, "a cigana te enganou que você sabe fotografar", ele usava um perfume estranho que agora eu acho uma delicia, porque me lembra que ele sempre passeava, que ele me dizia, "lá vai a borboleta gazear", que ele saia com uma pasta marrom amarrada com um elástico e que sempre voltava com algum doce pra dar pra gente. Ele era uma criança idosa, e não era por causa da segunda infância, era porque sempre foi jovem, otimista, risonho e alegre. Sinto falta de tudo, de fingir que acabei de acordar quando chego muito tarde em casa, e de fazer as unhas cascorentas dele, eu dizia que ia passar um esmalte e ele ficava profundamente irritado, mesmo sendo esmalte de homem, e na verdade nunca tive intenção de passar qualquer esmalte naquela unha, só de provocar o machão, sujeito homem, e de fazer ele falar, "Oooooora sô" com o sotaque mineiro, espremer os olhos em minha direção e ameaçar: "não precisa mais mexer em nada, deixa deixa". Era muito divertido!
Ou também poderia falar sobre as coisas bonitas que ele dizia, sobre como tratava as pessoas, sempre com respeito, com humildade, mesmo tirando sarro de todo mundo, sempre havia um tom de molecagem nas brincadeiras, ou sobre como você se importava com tudo, com todos, e como você era capaz de pedir desculpas pelas coisas mais simples e que não exigiam tal atitude e como isso me deixava envergonhada. Poderia falar que os seus olhos claros, eram límpidos e por ele dava pra ver a alma pura e sincera que o corpo vil e cansado escondia, as suas rugas sempre foram marcas do tempo, e nunca lhe deixaram feio. Eu chamava o seu cachorro de "garabininho" e vc chamava ele de "natalino", isso me faz querer gargalhar. Eu tenho orgulho do seu sangue, de assinar seu sobrenome, e sei que sua esposa e todos os seus filhos sempre o tiveram também, nenhuma das suas filhas e netas esconde isso, somos um fã clube.
Hoje é o dia do homem, e todas as vezes que alguma menina/mulher, me diz que todo homem é igual, que eles isso ou aquilo, eu me lembro que você existiu, e essa tese cai por terra, sei que apesar de muito ofuscados tinha defeitos, mas estava longe de ser igual, e sim eu poderia achar um deles, ou vários, mas é muito difícil lembrar. Sobre o dia dos homens eu digo, eles são criaturas literais e relativamente incompreensíveis, e alguns deles são pessoas especiais, conheço alguns, ser especial não é uma característica do gênero ou da espécie, e sim do subjetivo, baseado nas decisões que uma pessoa escolhe pra sua vida, a maioria dos homens está ameaçado por esse estereótipo e alguns adotaram perfeitamente o personagem, mas não é genérico, é no singular, se alguém tem dúvidas sobre a minha afirmativa fica o texto a cima, sobre um homem com H maiúsculo,o homem mais forte e mais sensível que conheci e o que eu mais amei em toda minha vida, não como homem, mas como tudo além que do gênero que ele sempre foi!
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